sábado, 23 de abril de 2016

IMPRESSÕES DE UM ENCONTRO COM JOÃO RICARDO PEDRO

Inevitavelmente estamos condicionados (conscientemente pleno das nossas faculdades cognitivas) pela assoberbada paixão de viajar através dos livros, autênticos passaportes para a nossa interacção com os autores, os lugares e as personagens, sem esquecer as tramas e as mensagens a apreender.
Ao gostarmos de conversar, vamos seleccionando as nossas leituras e os nossos autores, principalmente aqueles que possam acrescentar algo à nossa "douta ignorância". A noite de ontem, 22 de Abril de 2016, na Sala Couto Viana da Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, estivemos à conversa com João Ricardo Pedro, Prémio Leya 2011 (com «O Teu Rosto Será o Último») tendo como mote o seu segundo livro «Um Postal de Droit», um regresso à ficção, onde encontramos o espelho da nossa condição humana e “a ténue fronteira que existe entre sanidade e loucura e os laços perturbadores que tantas vezes unem a vida à arte”.



João Ricardo Pedro consegue aliviar-nos das tragédias, através de uma mochila encontrada nos destroços de um acidente de comboios, revitalizando-nos o subconsciente com o humor e figuras inesquecíveis: Em Setembro de 1985 dá-se um choque frontal de comboios em Alcafache. Algumas das vítimas mortais, presas nas carruagens a arder, nunca chegam a ser identificadas. No dia seguinte, a mãe de Marta recebe um inesperado telefonema informando que a mochila da filha – estudante de Belas-Artes – apareceu entre os destroços – lê-se em sinopse.
É a partir dos cadernos de desenho de Marta – uma espécie de diários visuais que espelham um quotidiano tão depressa sórdido como maravilhoso –, João Ricardo Pedro, tal como aconteceu a Silvana, faz-nos entrar no quarto da Marta (a mesma que desenhava à vista de todos, ostentando orgulhosa, o seu talento, e os cadernos…), por forma a desfazermos a cama, virarmos o colchão ao contrário, trocarmos os lençóis, a fronha da almofada, o cobertor de lã por uma manta mais fresca, de algodão. A melancolia e o acabrunhamento de Marta, “a Marta que ficava tardes inteiras escarrapachada no sofá da sala a ver televisão, a esvaziar pacotes de batatas fritas e tijelas de pipocas”, serve-nos de ponte emocional à arte criativo-literária de João Ricardo Pedro, quando nos dá a conhecer – vestido na pele de um narrador – um leque de figuras absolutamente inesquecíveis, entre as quais se contam prostitutas, boxeurs, polícias e assassinos, mas também anjinhos de procissão, médicos e senhoras da caridade. Quiçá, o paradigma das mulheres e dos homens duplicados.


E por aqui ficamos, sem que antes manifestemos a nossa positiva expectativa acerca de todas as páginas do livro. Num acto contraditório à interpelação do autor (à página 193), jamais deitaremos fora as expectativas ou livro.
Inevitavelmente, um autor que passaremos a seguir de perto, mas como até aqui, e à semelhança de outros... Discretamente.

Obrigado, pela noite maravilhosa que nos proporcionaram!

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