quinta-feira, 22 de junho de 2023

Pesadelos e o Mundo Secreto do Sono!...

«Todos os animais dormem. Por alguma razão há de ser. O mundo também muda à sua volta e o seu corpo deve mudar também. Sem sono, e a sua modificação de circuitos, não há mente…»

 

Pedro Cabral

(In, O Paradoxo do Cérebro, p. 97)

 

Apenas o olhar marca a nossa cumplicidade inabalável com o MESTRE (Professor Doutor Manuel Curado), nos momentos de perceção do inteligível, sendo que tal perceção não é a reminiscência de um mundo das ideias, mas sim a irradiação “divina” do inteligível.

Todos nós temos o direito de aspirar ao poder, ao topo, ao reconhecimento e à valorização profissional, mas só muito poucos, sem qualquer esforço, conseguem lá chegar, independentemente do seu valor ou não. Vivemos o tempo das incubadoras, das imagens artificiais, da construção do endeusamento pessoal e da idolatria pegajosa.

Os degraus das escadas, alusão clara ao esforço e evolução cognitiva, deram lugar aos parapentes, asas-deltas, paraquedas e afins. Quando o respeito, ao invés da tolerância, devia carregar uma polaridade ativa, constituindo-se assim numa virtude estruturante e intermédia que nos ajudasse na difícil travessia que nos conduz ao cume da ética, aparece a marca da indiferença e/ou da (in)tolerância em excesso que nos empurram para a generalização dos valores inferiores.


E ainda há quem tenha a coragem de nos dizer que, abusando do velho cliché, «O dinheiro não é tudo!». Aí, sempre nos vem à memória da Retórica em Aristóteles, quando este procede a uma análise das emoções: ira, calma, amizade, inimizade, temor, vingança, vergonha, desvergonha, amabilidade, piedade, indignação, inveja e emulação. A convulsão permanece, favorecendo sempre os asas-deltas.

Face aos nossos estudos científicos e algumas fragilidades presentes (– Sim, um homem não é de ferro!), para descomprimir em tempo de gozo pleno, sem dar satisfação a quem quer que seja – bastando para isso os 48 anos, 6 meses e 25 dias de trabalho, que contribuíram, a grosso modo, para nos atribuírem aquilo que acharam como um favor à nossa pessoa –, este é um dos nossos livros do momento: «O CÉREBRO NOTURNO: Pesadelos, Neurociência e o Mundo Secreto do Sono» do especialista em Medicina do Sono, Dr. Guy Leschziner, neurologista nos hospitais Guy e St. Thomas, em Londres, dirige o Sleep Disorders Centre, um dos maiores serviços de investigação e tratamento de distúrbios do sono da Europa. Trabalha também nos hospitais London Bridge e Cromwell. É ainda professor de neurologia no King’s College de Londres: «A insónia e a privação do sono estão muitas vezes associadas. Os riscos para a saúde da privação do sono, nessas pessoas que simplesmente não se permitem dormir o suficiente, estão bem documentados: mortalidade, aumento de peso, tensão arterial elevada, diabetes… a lista prossegue sem parar. É, portanto, natural que as pessoas com insónia se preocupem com estes problemas…» (LESCHZINER, 2020: 313).

Pena é que aqueles que nos vão tirando o sono não se apercebam também do seu aumento de peso (quiçá, na consciência), tensão arterial elevada, diabetes e, por proximidade, consequente mortalidade (ignorância). Não é que «O Cérebro Noturno» entrelaça histórias bizarras da vida real com ciência neurológica de ponta.

Aqui fica um conselho: Ler nunca fez mal a ninguém e ajuda a combater a ignorância e os incitadores insones!

(In, Cardeal Saraiva (Ponte de Lima), Ano 114, n.º 4912, 15 de junho de 2023) 

domingo, 11 de junho de 2023

A Educação Sentimental dos Pássaros!...

«Acham que a chuva se pergunta, enquanto cai, se vai favorecer a vida, ou se a vai tirar? A chuva cai sem consciência ética. A chuva é sempre boa, mesmo quando destrói. Eu sou como a chuva…»

 

José Eduardo Agualusa

 

Muitas vezes, em família e em memória dos tempos, e do tempo que está para lá dos tempos, recorremos esporadicamente aos livros e aos autores que vamos deixando para trás nas prateleiras da nossa biblioteca particular. É uma questão de segurança, de companhia permanente e de afrontamento à nossa aparente desilusão.  

Quase seis translações passadas, recordando o amigo/irmão José Eduardo Agualusa, e o seu livro A Educação Sentimental dos Pássaros, onde reúne onze maravilhosos contos, onze histórias, onze cenários – e, como ele mesmo escreve, onze possibilidades que têm em comum uma mesma preocupação sobre a origem e a natureza do Mal.

José Eduardo Agualusa, autor do mundo, angolano de nascença e de coração, qual menino do Huambo à volta da fogueira, que continua a viver entre ideias, realidades, sonhos e medos, sempre nos soube dizer que os anjos e os demónios caminham entre nós e nem sempre se distinguem uns aos outros. Às vezes as histórias aparecem-lhe enquanto dorme. Assim, sem tirar nem pôr.


Envoltos na ambição de nosso avô “Sakaita”, do qual herdamos também de discursar em provérbios. Dentro da “filosofia de elevador”, «Mbeu okulonda ko cisingi, omanu vokapako.», o cágado não sobe sozinho às árvores, alguém o colocou lá: «QUASE NINGUÉM REPARA EM MIM. As pessoas não me veem. Sopram na minha direção, “quinto piso”, “décimo quarto”, e logo me esquecem. A invisibilidade é uma questão de prática, como engolir espadas. Não falo em engolir espadas por acaso, amigo. Sei do que falo. Antes de ser ascensorista trabalhei quarenta e cinco anos num circo. Aprendi a engolir espadas, fogo, cacos de vidro, escorpiões, inclusive arame farpado. Com a prática um homem consegue engolir qualquer coisa. Estava a preparar-me para inovar o número, seria o primeiro artista a engolir armas de fogo e explosivos, granadas, cartuchos de dinamite, pistolas, talvez metralhadoras, quando me comecei a sentir mal, muito mal, fortes dores no epigastro, violentas náuseas, e descobri que tinha uma úlcera no estômago. Abandonei o circo…» (Agualusa, 2018: 75).

Realidades paralelas, onde ambos ficamos com a noção clara de que há poucas desgraças mais ridículas do que a traição, tendo em conta que esta «chega a ser mais ridícula do que levar com uma tartaruga na cabeça»: O ridículo é a lepra dos políticos. Nenhum político se atreve a apertar a mão de outro que tenha contraído o ridículo.  (Agualusa, 2018: 108).

Soubemo-lo pelo nosso amigo/irmão José Eduardo Agualusa, que Deus ao criar o primeiro Anjo, ofereceu-lhe um poderoso par de asas, explicando-lhe, contudo, que aquilo era mais um aparato de fé do que de voo.

Passadas seis translações, acabamos por abandonar o circo. E sempre vamos sabendo sorrir para quem nos faça sorrir e saiba sorrir!

(In, Cardeal Saraiva (Ponte de Lima), Ano 114, n.º 4910, 02 de junho de 2023.)