Embora a nossa predisposição para a
leitura tenha vindo a ser afectada por mazelas efectivas (e/ou dolorosas) da
«P.I.», sempre vamos arranjando alguma energia suplementar para a (leitura,
claro!) pôr em dia. No dia 31 de Agosto de 2016 ficamos a saber através do
jornal «I», Ano 7, Número 2255, p. 34-35, com chamada à primeira página, que
André Fernandes Jorge, o editor da COTOVIA, ao fim de setenta e uma translações,
desencarnou no pretérito dia 19 de Agosto, vítima de um cancro linfático, que o
martirizava há oito anos para cá.
Através de um excelente artigo assinado
por Diogo Vaz Pinto, com fotografias do editor André Jorge cedidas pela
companheira e parceira na «Livros Cotovia», Fernanda Mira Barros, ficamos a
saber que «editar livros como o fez André
Jorge, mais do que um acto de resistência, é hoje uma forma de optimismo. Foi
Tatiana Salem Levy quem, ao reagir à morte do seu antigo editor numa mensagem
no Facebook, reconheceu que o seu caso constitui “uma aberração nos dias de
hoje”; um editor que “publicava mesmo sabendo que o único retorno que teria
seria de ordem intelectual e afectiva, pelo simples prazer de publicar autores
que lhe interessavam” (...) A morte
de um bom editor é sempre uma tragédia que não se percebe...» (p. 35).
Plenamente de acordo, quando nos é dado saber que Fernanda Mira Barros «lembra que André Jorge não se coibiu de
afastar quaisquer ilusões de hipotético sucesso comercial a alguns autores que
se propôs editar. Dizia-lhes que em Portugal não iam vender nada. Aceitando ter
os seus livros neste catálogo os autores deviam abandonar as veleidades de se
verem como protagonistas de qualquer campanha que os vendesse como a última
coca-cola do deserto» (p. 34).
A «COTOVIA» NÃO ABANDONOU O RIGOR DOS
SEUS CRITÉRIOS NEM CEDEU AOS IMPERATIVOS DE MERCADO, CONFORMANDO-SE COM O PAPEL
DE EDITORA DE CULTO, como CULTO era o seu editor.
Daí a qualidade sobrepor-se à quantidade:
«A mesma teimosia que o impediu de se
deixar abater pela doença foi o traço que se converteu na principal virtude de
um catálogo que confrontou as deficiências da edição portuguesa, seguindo um
plano ambicioso com a consciência de que só perdendo dinheiro se pode trazer o
mundo que falta a uma língua. Quer isto dizer que os cerca de 1200 títulos
publicados ao longo de quase três décadas pela Cotovia são o legado de um homem
que optou por entregar a vida e a sua fortuna pessoal a algo que aproveita a
todos – a verdadeira definição de luxo público…» (p. 35). Há legados que se
apagam com o tempo, enquanto outros ajudam a imortalizar a sensibilidade – como
houvera escrito Sterne – um dos primeiros
bens, e o mais belo ornamento do homem.
Até sempre, António Fernandes Jorge!
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