segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

LUÍS FILIPE CASTRO MENDES E «OUTRO ULISSES REGRESSA A CASA»

Luís Filipe Castro Mendes, que conhecemos nas Corrente d'Escritas deste ano (2016), nasceu em 1950 e, ainda muito cedo, entre 1965 e 1967, foi colaborador do jornal Diário de Lisboa-Juvenil. Em 1974, licenciou-se em Direito pela Universidade de Lisboa e desenvolveu, a partir de 1975, uma carreira diplomática, tendo nomeadamente sido Cônsul Geral no Rio de Janeiro e depois Embaixador em Budapeste, Nova Deli e junto da UNESCO. É, neste momento, Embaixador de Portugal junto do Conselho da Europa, em Estrasburgo. Enquadrável numa estética pós-modernista, a sua obra revela um universo enigmático onde o fingimento e a sinceridade, o romântico e o clássico, a regra e o jogo conduzem às realizações mais lapidares e expressivas.


Integrando a Mesa 6 (10:00 do dia 26 de Fevereiro de 2016) dum painel subordinado ao mote «Escrever é ganhar e perder», secundado por Daniel Sánchez Pardos, Francisco Conduto de Pina (representado por Fernando Negrão) e Miguel Real, tendo como moderador Pedro Teixeira Neves, Luís Filipe Castro Mendes colocou em ênfase o perder, sempre que no ganho do viajar, cada vez que saímos desses países acaba-se por perder algo, amigos e lugares onde se foi feliz. Segundo Castro Mendes, a ideia da perda é muito forte na poesia, sendo que essa ideia está ligada à melancolia. A perda como irreversibilidade melancólica: Se eu não escrever perco muitas potencialidades - disse a dado momento. Referiu-se a Fernando Pessoa como um dos grandes desafiadores da nossa modernidade. O poeta é aquele que mais inspira do que é inspirado, e o seu ganho está nos leitores, sinal acrescido dessa sensação de ganho, quando tem alguém que o leia.


Pela 12 horas desse mesmo dia, na Sala de Actos do Cine-Teatro, seguiu-se o lançamento do seu livro de poesia «Outro Ulisses regressa a casa», numa edição da Assírio & Alvim (uma chancela da Porto Editora), Fevereiro de 2016, que, segundo o autor, é um livro de "ficção em poemas" e o "leitor encontrará muitas alusões, referências e citações encapotadas, às quais não deve ligar demasiado".
Pela sua maravilhosa arte de poetar perpassam cidades que nunca atravessou, nomes que ressoam da infância, Cidades como casas desfeitas, / caixotes abertos no chão, gavetas por esvaziar, / livros que sempre sobram. / É fácil resumir uma vida. / O que dela ficará, não sabemos. Mais certamente / nada (p. 7), sempre com a noção de recomeçar e do regresso, voltar a casa, mesmo que as portas rangem e os móveis são tomados pelo pó.


Para Luís Filipe Castro Mendes, homem viajado, qual trota-mundos nas asas da poesia, O tempo que resta não é para confissões / nem para ajustes de contas: / pois quem guarda o guardião, quem despe a roupa / das vestais do templo? / A água corre ainda, um fio sequer, de torneiras / em desuso. Respiro e não deixo de olhar. / Até ao fim não deixarei de olhar... (p. 9). Um olhar de quem viaja, aprendendo e revisitando espaços e lugares, sentindo, ao mesmo tempo, insónias de um velho, respostas para quem sempre andou por fora, alojando-se nos "pretextos de poemas", observando e escrevendo. Tal como o afirmara no painel: Todos os caminhos conduzem a este lugar / chamado melancolia: mas não te julgues / privilegiado só porque chegaste ao que é comum / a todos e a cada um: o que pensas e sentes / sempre se irá desfazer / nas palavras incompreensíveis de uma língua morta, / num disco arranhado, num borrão de tinta a espalhar-se / na tela. Por isso é tão trivial o que dizes, / como repetir o gesto de enfiado cansaço / com que me recebeste esta noite, melancolia... (p. 23). Uma melancolia saudável, por um grande poeta que não conhecíamos, servida pelo luar, pelos alicerces da vida, pelo gosto dos jantares de província e pela memória, escutando o Anjo, esperando a exortação.
NOTA MÁXIMA!    

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