Em Cabanas, recanto
sereno de Afife, onde o mar se insinua por entre os montes e a brisa traz
rumores antigos, Pedro Homem de Mello encontrou o seu pouso da alma. Ali, longe
do rumor das cidades e perto da música primordial da terra, ergueu-se o seu
refúgio de silêncio e poesia.
As fragas guardavam-lhe
os passos como confidentes ancestrais, imutáveis, fiéis. No sussurro do vento
entre os pinheiros, ouvia-se o eco do verso ainda por escrever. E era como se o
tempo ali hesitasse – como se o mundo se demorasse um pouco mais, para escutar
o murmúrio do mar e o pensamento do homem que o contemplava.
«As águas são para o mar,
/ As folhas são para o vento. / Só as fragas se não mudam! / Nelas ficam o
pensamento…» – esse breve brado poético ressoa como oração laica, como segredo
revelado àqueles que sabem escutar com o coração aberto.
As águas levavam o
efémero. As folhas, o instante. Mas as pedras – aquelas pedras do Norte, firmes
e silenciosas – sabiam guardar o que é essencial. Em cada fissura da rocha,
Pedro Homem de Mello deixava um verso, uma memória, um fragmento da sua
eternidade.
Em Cabanas, a paisagem não era apenas cenário: era corpo e espírito, era matéria viva onde o poeta se fundia. E assim ficou incrustado nos musgos, na maresia, na sombra dos carvalhos – como quem, ao encontrar o seu lugar no mundo, escolhe não partir mais.
(In, A Aurora do Lima, Ano 170, Número 18, quinta-feira, 29 de maio de 2025, p. 16)
