sábado, 4 de outubro de 2025

BRUMAS DO TEMPO (XVI)

 As varandas iluminadas da Misericórdia de Viana do Castelo, sob o manto da noite, não são apenas pedra, luz e história – são espelhos da alma humana. O edifício da “Casa das Varandas” transcende o tempo ao carregar em si o gesto de cuidar. Ali, onde o Renascimento e o Maneirismo se encontram, pulsa uma arte que não se limita ao estético, mas se expande ao ético. A beleza das colunas, das arcadas e das linhas harmónicas reflete a procura do homem pelo equilíbrio entre razão e sensibilidade.


Inspirada por mestres italianos e flamengos, a estrutura nasce num tempo em que o homem se redescobria como centro do mundo. Mas neste caso, o centro não é o ego, é o outro – aquele que sofre, aquele que precisa. A confraria da Misericórdia, ao construir este espaço, inscreveu na pedra um ideal de compaixão. Cada varanda é palco de uma silenciosa promessa: ver o mundo com olhos de humanidade.

A Arte, aqui, não é apenas ornamento, é gesto. É uma mão estendida, é a arquitetura do cuidado. Num tempo de luzes e sombras, de dúvidas e certezas, a Casa das Varandas ergue-se como símbolo de um humanismo ativo. Assim, este edifício não é apenas memória – é proposta. É chamado à empatia, à responsabilidade, à transcendência. Porque a verdadeira Arte não é indiferente. Ela educa o olhar, desperta a consciência. É voz do silêncio, é ética em forma de matéria. E quando a luz da noite banha estas varandas, não vemos apenas um edifício renascentista. Vemos um ideal – o de um mundo onde a beleza e o cuidado caminham juntos. Como deveriam caminhar sempre!

(InA Aurora do Lima, Ano 170, Número 16, quinta-feira, 15 de maio de 2025, p. 17)

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