A dignidade da
memória e o valor dos que partem. Num mundo cada vez mais acelerado e pragmático, a
figura do emigrante surge como um paradoxo silencioso: ao mesmo tempo em que
representa a ausência, carrega consigo a presença mais fiel de uma terra – a
memória viva de um lugar no coração. Poucos desejam verdadeiramente emigrar. A
partida, quase sempre, é imposta pela necessidade, pelo sonho de dignidade, por
uma esperança que a terra natal, por si só, já não consegue oferecer. No
entanto, é justamente essa ausência que, ao longo do tempo, se transforma em
presença estrutural.
É imperativo, do ponto de vista ético, que a sociedade reconheça o
valor do que foi feito longe, mas com amor à origem. Em cada pedra enviada, em
cada carta escrita, em cada regresso temporário, há um esforço de ligação. Não
reconhecer isso é trair a identidade coletiva. A ingratidão, quando
institucionalizada, gera amnésia cultural – e uma comunidade que não honra os
seus não é mais do que um aglomerado sem alma.
Monumentos como o painel de azulejos de Vila de Punhe fazem mais do que homenagear. Eles reconstroem, simbolicamente, a ponte entre o que partiu e o que ficou. Mais do que arte, são memória. Mais do que beleza, são ética. Valorizá-los é compreender que o progresso não se mede apenas pelo que se constrói com os que ficam, mas também com o que se recebe dos que partem. O verdadeiro futuro de uma comunidade começa quando ela honra, sem hesitação, os seus pilares invisíveis.
(In, A Aurora do Lima, Ano 170, Número 22, quinta-feira, 03 de julho de 2025, p. 19)
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