sábado, 4 de outubro de 2025

BRUMAS DO TEMPO (XIX)

Em Vila Franca do Lima, Viana do Castelo, no coração de uma pequena oficina, entre o cheiro da madeira e o som ritmado das ferramentas manuais e mecânicas, trabalha António Barrosa, um verdadeiro mestre da arte de esculpir a memória. Artesão apaixonado, dedica-se há décadas à criação de réplicas perfeitas de utensílios tradicionais, recriando com minúcia e alma objetos que fizeram parte do quotidiano de gerações passadas.

Mas António não se limita ao utilitário: entre as suas obras mais impressionantes estão bicicletas antigas – funcionais e ao tamanho natural – totalmente construídas em madeira rija – sim, até os pedais e as correntes! Cada peça, por mais pequena ou complexa que seja, é talhada à mão, com uma paciência que só quem ama profundamente o que faz consegue manter. O resultado é um acervo vastíssimo de milhares de miniaturas e réplicas ao tamanho natural, todas, testemunhos vivos de um Portugal que resiste ao esquecimento.

A obra de António Barrosa é, em si mesma, um património cultural inestimável. Infelizmente, grande parte deste tesouro continua guardada longe dos olhos do público. É urgente a criação de um museu que acolha de forma digna e permanente estas peças. Um espaço onde se possa celebrar não só a arte do artesanato tradicional, mas também a persistência de quem, contra a maré do tempo, continua a dar forma à história com as próprias mãos.

Preservar o legado de António Barrosa é preservar a identidade de um povo. É dar às gerações futuras a oportunidade de ver, tocar e sentir as raízes de onde viemos. Um museu não seria apenas uma homenagem ao artesão, mas um ato de respeito pela nossa memória coletiva.

(InA Aurora do Lima, Ano 170, Número 19, quinta-feira, 05 de junho de 2025, p. 17) 

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